quinta-feira, 17 de maio de 2018

Entrevista com Gordo do projeto de harsh noise D.O.M





"Anderson Alves, mais conhecido como Gordo. O cara tem 35 anos e desde a sua adolescência é apaixonado por barulho e busca de alguma forma expressar seus sentimentos e ideias através do noise. Sujeito incansável, já participou de vários projetos D.I.Y. e atualmente mantém ativo o fudido D.O.M (harsh noise), Insane Human Mind e Insektoj (noisecore). Dentro das possibilidades, e com muitas dificuldades, mantém os selos/distros "Fat/Zombie" e edita o zine em papel e xerox Alucinoise com uma regularidade surpreendente. Também gosta de escrever poesias, insiste e resiste em fazer algo de útil dentro do underground".


Saudações amigo de longa data, Gordo! Cara, já trocamos muitas cartas não é meu velho? Agradeço imensamente por aceitar participar desta entrevista e colaborar com as discussões propostas pelo Ocupa Noise Guerrilha Zine. De cara já digo que o D.O.M é muito foda [risos].

Gordo: "Poxa, põe tempo nisso, muitas cartas sociais com selos de $0,01, várias fitas em cartas sem registro, satisfação toda minha meu irmão, valeu mesmo, o A.V.N. também me inspira muito".

Valeu pelas palavras! Fico satisfeito em saber que o A.V.N te entusiasma de alguma forma. Para começo de conversa, diga-nos como se deu seu primeiro contato com o underground D.I.Y. punk/metal/noise?

Gordo: "Foi no final dos anos 90, antes disso, não diferente de muita gente, ouvia as rádios de rock convencionais. Depois que me mudei para Itapevi/SP tive uma aproximação muito forte com o rap nacional que até hoje gosto bastante. Gravava muitas fitas dos programas que ouvia, mas logo conheci meu grande amigo Rikardo Chakal (Uniformes Negros T-shirts & Visual Agression Zine), foi ele o responsável por me apresentar o barulho underground. Me emprestou toda sua coleção de discos, onde pude conhecer o Rot, Carcass Grinder, Violent Headache, Rattus, Terveet Kädet, Carcass, Napalm Death, Intestinal Disease, Necrose, etc, e aquelas fitas de rap e rock se tornaram fitas de noisecore, grind e hardcore. Ele me incentivou a iniciar os contatos com as bandas, colávamos juntos em gigs, produzíamos zines. Montamos 3 projetos na época o Kaos Muerte Depression (noisecore), Homo Detruo (grind core) e o Diskharte (raw punk/hc). Até hoje mantemos uma irmandade sólida. Meu gosto anti-musical só piorou de lá para cá".

Grande Rikardo Chakal, quero entrevistá-lo também [risos]. Fale um pouco sobre o D.O.M, projeto barulhento na ativa já faz um bom tempo e com vários lançamentos, não é?

Gordo: "O D.O.M. teve início em 2000, e ficou ativo até 2008 onde esteve em um silêncio mórbido por quatro anos. Em 2012 retornei as atividades e fiz a primeira apresentação ao vivo no festival "Noise In Your Head" realizado no Quilombaque em Perus/SP. Comecei a lançar alguns materiais que estavam gravados a muito tempo, e que foram resgatados pelo meu velho amigo Rodrigo Romanim, que havia digitalizado quase tudo que o D.O.M. tinha gravado. Então, são vários materiais lançados durante estes anos e alguns que ainda estão por vir".

Muitos materiais, sei que a discografia é extensa. Comente sobre o processo de construção dos barulhos. O que mais te motiva no momento de criação?

Gordo: "As inspirações são as mais variadas. Toda situação que estou vivendo (que em sua grande maioria são situações bem ruins, infelizmente). A forma que observo o mundo e as atrocidades cometidas pelo ser humano que é o maior predador da face da terra, e agora querendo conquistar outros planetas para também explorá-los e destruí-los. O barulho, de um modo geral é minha válvula de escape, com ele expresso todo ódio, frustração, revolta, amargura, tristeza, chatice, monotonia, desgosto, preocupação que sinto. Tenho total liberdade para criar meus barulhos, podendo ser noisecore, harsh, industrial, experimental, sludge, dance, ou até mesmo utilizar ruídos alheios como já fiz. Outro fator que influencia bastante no processo de criação são as ferramentas para a construção dos barulhos. Antigamente usava um radinho à pilha, e andava pela cidade de Itapevi gravando tudo o que era ruído, depois utilizei um toca discos quebrado e vinis riscados. Também já convidei alguns amigos para fazer uma session noisecore com instrumentos. Já usei batedeira, violão, pandeiro, liquidificador, copo, ventilador. Captei os ruídos de máquinas das empresas que trabalhei. Ultimamente tenho utilizado bastante programas de computador onde misturo sons "artificias" e sons "orgânicos", ou só artificias mesmo, foda-se!!! Não existe limites para se fazer barulho, não existe regras para se fazer barulho, não existe padrões pré-estabelecidos para se fazer barulho!!!!!


Compreendo o que você diz, porém, tenho minhas dúvidas em relação a tal liberdade, uma vez que sempre existe a “polícia” do noise querendo ditar e impor regras no que se refere a produção de barulhos. Bem, em uma das nossas conversas pelo face, você chegou a comentar que antes você tinha uma certa crítica contra webzines, lançamentos virtuais, todavia, hoje olha para tudo isso de outra maneira. Por favor, discuta mais sobre tal mudança?

Gordo: "Já fui bastante crítico com relação a este assunto sobre lançamentos virtuais, mas observei que eu estava sendo contraditório saka?!?! Quando eu quero fazer uma arte para um lançamento eu procuro na internet. Quando vou fazer um split conheço e entro em contato com a banda/projeto pela internet, então porque ser contra, porque criticar, sendo que eu também faço parte e tiro proveito deste "mundo virtual", não é mesmo? E também hoje em dia, nessa fudida situação de total falta de recursos que a grande maioria das pessoas tem vivido, lançar um zine, um material sonoro pela internet é a solução mais viável. Adoro meus materiais físicos, vou continuar lançando e adquirindo na medida do possível, mas acredito ser totalmente válido lançamentos em qualquer formato, quem vive o real underground, sempre vai ser underground, independente de "mundinho virtual" ou "mundinho físico".

Sim, concordo com suas colocações. Eu ainda tenho uma relação “física” muito forte com o material que escuto, no entanto, estou me desprendendo aos poucos. Tem uma galera abusando na venda de cds, tapes e vinis (principalmente). Acho que existe muita coisa interessante na internet, como a facilidade de informação e fácil acesso a materiais, por exemplo. Penso que a questão é saber o que vale a pena, ou não, para cada pessoa. Seguindo, fala sua: “barulho pela vida, não só por hoje e não só por poser”. O que pode o underground D.I.Y punk/metal/noise como revolução diária? Digo isso, pois tal fala remete muito a uma questão de existência, penso.

Gordo: "Na verdade esta fala é do Marcelo Batista (Extreme Noise Discos) ele escreveu isso em um manifesto sobre grindcore nos anos 90, eu só adaptei a frase. Pode muito eu diria, na minha vida o underground teve uma influência fundamental, não ser igual as outras pessoas "normais", não compartilhar de ideias idiotas como a maioria alienada, ter um senso crítico sobre questões relevantes, isso o underground me proporcionou. Quando sofria preconceito por ser obeso, por ser pobre, por ser da periferia, foi no underground que me senti acolhido e respeitado. Infelizmente como em todas esferas sociais existem pessoas totalmente imbecis e contraditórias que mudam de ideias extremas para merdas extremas, mas acredito sim no underground d.i.y. como revolução diária e pessoal".

Sei que a fala é do Marcelo, porém, se você a reproduz, de alguma forma é sua também [risos]. Visual agression (não é o zine)?

Gordo: "Agredir a moral, agredir o sistema, sempre é válido, não só agressão visual, mas também agressão sonora e em alguns casos agressão física, depende da situação".

Materiais físicos ou downloads? Zines de papel ou webzines?

Gordo: "Todos são válidos. Webzines e downloads estou tentando me adaptar".

Políticos brasileiros?

Gordo: "Em sua grande maioria exploradores, corruptos, mentirosos, parasitas. A população é vítima, mas ao mesmo tempo é cúmplice, por não se informar, por não reivindicar seus direitos, por aceitar cegamente o que a mídia capitalista e sensacionalista joga em suas mentes.

Morte?

Gordo: "Algum dia tod@s encontraremos com ela, sinceramente falando, não quero encontrá-la muito tarde".

Punk is dead?

Gordo: "Punk capitalista, punk poser, punk faquinha que morra!!! Punk d.i.y., consciente, ativista, resistência sempre!!!"

Fale um pouco sobre como é o seu cotidiano?

Gordo: "Estou desempregado, então, o tempo é bem ocioso. Procuro ajudar minha família naquilo que posso, faço meus corres para arrumar uns trocados, ouço muito barulho e ocupo o tempo tentando produzir o máximo que conseguir.

O que você pensa sobre o dito “radicalismo coerente”, muito comum nos anos 90 no cenário barulhento e que algumas pessoas envolvidas com o underground atual defendem?

Gordo: "Radicalismo coerente" é o radicalismo que tenta preservar a contracultura underground, onde algumas posturas podem ser extremistas, mas, que tem um ponto de vista sério e ideias realmente coerentes. Bem diferente do "radicalismo separatista" que exclui as pessoas e nega o direito ao conhecimento utilizando critérios para saber quem merece conhecer esta ou aquela banda. Quem merece adquirir este ou aquele material, quem merece estar ou não em determinados eventos. Esse tipo de radicalismo é execrável e tem que ser combatido.

Terminado nossa conversa por aqui, pergunta clichê do zine: você ficou sabendo que um imenso meteoro vai cair no planeta terra e destruir tudo, diga os três últimos plays que você ouviria?

Anderson Gordo: Mano, eu não iria ouvir porra nenhuma, me esconderia debaixo da cama!!!!! Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk...

 Ótima resposta mano [risos].


Ouça aqui: 





Obs: imagens cedidas e autorizadas pelo entrevistado. 
 As falas do entrevistado foram mantidas na íntegra para não serem descaracterizadas. 





9 comentários:

  1. Quando sofria preconceito por ser obeso é pobre é da periferia o Underground me acolheu essas palavras me tocam por que eu bem sei como e isso é posso dizer que foi no Harshnoise e no noisecore que eu encontrei forças quando o metal me afastava com suas regras e suas papagaidas o punk o faça você mesmo os Fanzines me mostraram que eu podia e devia continuar desenvolvendo e construído conteúdos poderia citar amigos que me influencia mais quando ouço e vejo projetos como o D.O.M me dão forças e inspiração para continuar por que caras que suam para rodar e fazer o Underground seguindo em frente destruindo as dificuldades do dia a dia baita iniciativa mano Wesley.

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    1. Belas palavras meu amigo, agradeço pelo apoio. Resistência hoje e sempre .

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  2. AGRADEÇO GRANDEMENTE ESTA OPORTUNIDADE DE EXPOR UM POUKO DAS MINHAS IDEIAS, VALEU MESMO MEU VELHO E KERIDO AMIGO WESCLEY /A.V.N./OCUPA NOISE GUERRILHA ZINE.

    MEU CARO AMIGO JONAS FIKO EMOCIONADO AO SABER QUE O D.O.M. REPRESENTA ALGO DE IMPORTANTE EM SUA VIDA, VC É UM GUERREIRO, E AQUI SEMPRE TERÁ O APOIO E O RESPEITO
    QUE NECESSITAR, TAMO JUNTO IRMÃO.

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  3. Excelente entrevista !!! D.O.M. com certeza é uma grande inspiraçao .... valeu por tudo e por todos envolvidos !!!

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  4. Valeu pessoal pela entrevista taobacanat. É estimulante ler esse tipo de conteúdo, fato que está ficando cada dia mais raro em meio a tanta baboseira no meio virtual. Toda força ao zine e Gordo fique certo que não estás sozinho. Estamos juntos, maninho e o respeito e a admiração só aumentam. Grande abraço!

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    1. Agradeço muito meu querido por suas palavras, Tamo junto sempre,
      Grande abraço!!!

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  5. muito boa a entrevista,tenho dois projetos(um de noisegrind e outro de noisecore)Suicídio Urbano e Derbys n' Corotes,sendo o primeiro com temática de protesto,problemas sociais,problemas internos(psicológicos e psiquiátricos)etc,enquanto o segundo é voltado mais ao humor ácido.O Suicídio Urbano começou como projeto solo e depois se tornou uma banda com o meu amigo,a segunda surgiu depois,lançamos um EP Noisecore do Suicídio hoje:https://www.youtube.com/watch?v=RLIkAnFYspI&t=1s

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